segunda-feira, 1 de abril de 2013

A mulher que enganou o Diabo

Um homem morava com a mulher e os filhos no subúrbio de uma cidade. Ele queria muito bem à aquela mulher e à aqueles filhos. Um dia, o homem foi fazer uma viagem. No caminho, encontrou um molequinho deste tamanhinho. O molequinho disse: – Oh! Vai de viagem, camarada? – Vou. De quem é você, Molequinho? – Eu sou de quem eu quiser. – É? – É. O homem foi–se embora e o Molequinho desapareceu. O homem ficou atentado derna dessa data. Quando esse homem chegou em casa, haja brigar com a mulher – que nunca tinha brigado! Haja ele brigar com a mulher, ameaçar de dar na mulher. A mulher, religiosa, rezava muito, rezava muito. O homem ia para o roça com os dois filhos, o Diabo vinha, mijava dentro do fogo para quando fosse na hora deles virem almoçar, o comer não estar pronto. A mulher se aperreava, só não fazia chamar nome. Ela dizia assim: – Mas eu queria saber o que vem ser uma coisa dessa: meu marido e meus dois filhos não tem essa vez que cheguem e a comida esteja pronta! E pelejava com o fogo, pelejava com o fogo. Quando foi um dia, ela disse: – Que me atine17 Nosso Senhor! Eu só queria saber o que vem a ser isso. Meu marido briga comigo, me ameaça. Só não dá n’eu por causa de meus filhos que não deixam. Que vem ser uma coisa dessa? Eu vou botar comida no fogo. Agora quero ver uma coisa. Comida no fogo! Foi botar comida no fogo. Aí, ela ouviu uma voz dizer: “Olha. Faz três cruzes e vai ver um galhinho de hortelã e bota na panela para o Diabo não encostar.” Ouviu? Com as três cruzes ele não vinha. Ela foi, fez o fogo, fez as três cruzes, foi ver o galhinho de hortelã – daquela miúda, que é boa para tentação – botou na panela. A mulher fez aquela comida suavemente – fez o que ela entendeu, ouviu? Disse: “Agora eu já sei qual é o remédio, ouviu!” Sem ela saber de nada. E o Diabo tecendo!… O Diabo encontrou o homem no caminho – isso quando o homem ia sozinho – disse para ele mesmo: “Eu não ganhei a alma de tua mulher não, mas vou ganhar a tua. Eu vou fazer um meio de atentar ela para ela ser falsa a tu e tu matares ela.” O homem já vivia atentado, já vivia atentado. Saltou o Molequinho na frente do homem: – Mas Molequinho, quem é você? – Adepois você é sabedor quem sou eu. Adepois eu lhe digo quem sou eu. Olha, a tua mulher, naqueles dias em que tu ias para o roçado, que tu vinhas para casa e não achavas o comer cozinhado, era ela prestando atenção a rapaz para namorar. O Diabo mentindo. O homem disse: – E foi? – Ela vai continuar namorar, não se importando nem com os filhos nem com você. O Diabo dizendo ao homem. Disse: – Você quer que eu lhe diga uma coisa. Eu faço um negócio com você. O Diabo disse ao homem: – Eu faço um negócio com você. Eu me viro num besouro e me soco dentro duma garrafa, você tampa e me leva para sua casa. O que ela fizer, eu lhe conto. Sem a mulher saber. A mulher não sabia de nada disso. O homem disse: – Está certo. Uma mulher honesta, nunca namorou com ninguém!… A tentação não pegava nela. Sem ela saber de nada. O homem preparou um garrafa, o Diabo virou–se num besouro e entrou nela. O homem tampou a garrafa em que o Diabo estava dentro, levou para casa e botou detrás de uma fôrma – aquele pote grande de botar água. Sem a mulher saber de nada. Honestamente cuidando da casa dela. O homem quando vinha era atentado. E o Diabo dizia sozinho: “Eu tenho que ganhar uma alma. A dela eu não ganho não, mas eu ganho a dele, que eu faço um meio que ele mata a mulher.” O Diabo dizia. Quando foi com uns tempos, a mulher foi tirar aquela fôrma. Pegou um menininho deste tamanho, disse: – Ô Fulano, vem cá. Vamos tirar essa fôrma daqui, que ela está boa de ser lavada. Mais nunca foi lavada… O menino pegou de um lado da fôrma, ela pegou de outro: ela viu a garrafa! Ela disse: – Ôxente! Uma garrafa! E tem um besouro dentro! Um besouro. O que é isso? O besouro dentro da garrafa tampada com tampa de cortiça. Ela disse assim: – Eu vou abrir essa garrafa para esse besouro sair de dentro dela. Abriu: pan! Saltou o Molequinho! O Molequinho dançava, fazia graça. Disse: – Ah! Agora muito bem! Agora, tu me soltaste, eu vou fazer teu marido te matar e ganhar a alma dele. O Cão dizendo à mulher. – Ah! Tu me soltaste, que eu não era para sair dessa garrafa. Agora tu me soltaste. Agora está como eu quero. Vou fazer teu marido te matar para ganhar a alma dele. Aí a mulher disse assim: – Ah! Eu não acredito que você estava dentro dessa garrafa! Aquela mulher! – Apois eu estava dentro dessa garrafa. – Eu não acredito! Você, cabe não. Como é que você, desse tamanho, cabe dentro de uma garrafa! Você não estava aí. – Apois eu vim de dentro dessa garrafa. – Eu só acredito que você estava dentro dessa garrafa se eu vir você entrar. – Eu? Eu? Eu estou solto. Eu entro nada! – Apois eu não acredito que você estava nessa garrafa. E teimaram. E teimaram. Aí o Molequinho disse assim: – Apois eu vou entrar. Mas tu não me tranca não, ouviste! O Diabo dizendo à mulher. O Diabo virou num besouro, pô! – na garrafa! Ela pô, a tampa! Enganou–o! Disse: – Ah! Tu me enganaste, hem! O povo diz que mulher engana até o Diabo. Tem esse dizer. Ela botou lá a jarra e botou a garrafa no mesmo cantinho. Disse: – Deixa meu marido chegar qu’eu tenho uma conversa com ele. Ele botar o Diabo para me botar sentido! E o Diabo dizer que vai ganhar a alma dele, que a minha diz que não pode porque eu rezo muito. Mais tarde chegaram o homem e os filhos, que vinham do roçado. O homem acabou de almoçar, descansou um pedaço, a mulher disse: – Fulano, eu vou lhe dizer uma coisa: você veio com o Diabo dentro de uma garrafa? Eu destampei a garrafa saltou aquele molequinho de dentro. Disse que era para botar sentido em mim e atentar você para me matar para ganhar sua alma. Agora, marido, eu vou lhe dizer uma coisa. Eu vivi com você até hoje. Vou–me embora para a casa de meu pai e de minha mãe, que eu ainda tenho pai e mãe. Os filhos, quem quiser me acompanhar, vai comigo, quem não quiser, fica com você. Eu mesma não vou morar mais você mais não. – E é? Não faça isso não. Você deixar sua casa e ir–se embora para a casa de seu pai e de sua mãe! Me deixar! – É. Ele disse: – Vamos fazer um negócio. – Que negócio é? Ele disse assim: – Bem, Fulana, hoje eu não vou para o roçado. Você vá trabalhar. Eu vou uma viagem. Ele disse com a mulher. A mulher pegou a garrafa com o Diabo dentro e foi para a casa do pai e da mãe dela. O homem foi com ela. Ele levou uma enxada e uma pá. Quando chegou muito adiante, na beira da estrada tinha uma pedra deste tamanho – aquela pedrona! O homem disse assim: – Mulher, vamos cavar um buraco bem fundo detrás desta pedra e enterrar essa garrafa. Enterrar o Diabo dentro da garrafa. Cavaram aquele buraco bem fundo e botaram o Diabo dentro da garrafa. Danaram o pé, bateram bem batido. Depois, voltaram para trás. – Nunca mais aquele Diabo vai me atentar, mulher, para eu lhe maltratar. A mulher disse: – Marido, olha. Aquele Diabo disse a mim que queria ganhar a sua alma. Não queria ganhar a minha não porque eu rezava. Você cuide de rezar. Com uns tempos, apareceu uma voz naquela pedra onde eles tinham enterrado a garrafa com o Diabo dentro. – Quem me tira deste buraco! Aquela voz. Todo mundo corria assombrado, com medo. Aquela voz dizia: – Quem me tira deste buraco! Ninguém via nada. Aquela voz era o Diabo pedindo para desenterrar ele do buraco, ouviu? Bêbado não tem medo do nada. Bêbado. Um dia, vinha passando um bêbado pela pedra e lá vai a voz dizer: – Quem me tira deste buraco! Quem me arranca deste buraco! Cave e me tire deste buraco! O bêbado disse: – E por que você está aí? Quem foi que lhe enterrou nesse buraco? – Foi um homem. Eu não pude laçar a alma dele por causa da mulher. E ele me enterrou aqui neste buraco. O bêbado disse: – Você fica aí para séculos sem fim nesse buraco! Você não sai mais não. Não acha quem arranque você daí mais nunca! O bêbado. O bêbado seguiu adiante. Quando chegou na frente, tinha uma encruzilhada, ele ouviu uma visão dizer: – Quem me julga? Quem me julga? Ele disse: – Que história é essa? “Quem me julga?” “Quem me julga?” Ali, quando eu vinha atrás, ouvi aquela voz me dizer quem tirava ela do buraco. E agora está dizendo: “Quem me julga?” Eu não tenho medo não! Quem te julga ou é Deus ou é o Diabo! Disse para a voz. Esse não se perdeu não porque ele falou em Deus. Mas se ele tivesse chamado: “Quem te julga é o Diabo!” Ele tinha ido. Fim a estória. Conto extraído do livro Estórias de Luzia Teresa 3.

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